sexta-feira, 23 de abril de 2010

Perdas e Ganhos


A vida não tece apenas uma teia de perdas, mas nos proporciona uma sucessão de ganhos.
O equilíbrio da balança depende muito do que soubermos e quisermos enxergar.
Somos autores de boa parte de nossas escolhas e omissões, audácia ou acomodação, nossa esperança e fraternidade ou nossa desconfiança. Sobretudo, devemos resolver como empregamos e saboreamos nosso tempo, que é afinal sempre o tempo presente.
Se viver sozinho já é duro, viver em família pode ser onerado e oneroso. Sofremos com a falta de dinheiro e tempo. Sofremos com a precariedade dos laços amorosos. Sofremos com a necessidade de suprir cada vez mais os mandatos do consumo. Sofremos com o pouco espaço para diálogo, ternura, solidariedade dentro da própria casa. Principalmente, não temos tempo ou disponibilidade para o natural exercício da alegria do afeto.
Não defendo os pais vítimas, que "por amor aos filhos" desistem de sua própria vida. Não admiro a mãe sacrificial que anula sua personalidade com a mesma alegação, para no fundo culpabilizar os filhos e lhes cobrar o que lhe "devem" e até o que "não devem".
Atrás e a frente de cada casal humano estende-se uma longa cadeia de erros e acertos geradores de humanidade.
Ensinamos aos nossos filhos que são belos e bons, que são príncipes do espírito...fazemos com que se sintam uns coitados, uns estorvos, motivo de preocupação e desgaste, de brigas e de arrependimento, lançados numa aventura fadada ao fracasso?
Criamos almas subalternas se podíamos criar almas livres?
Para que nossos filhos tenham boa autoestima é necessário passar uma visão positiva, não cor-de-rosa ou irreal, significando confiança. Capacidade de alegria busca de felicidade, crenças.
Mudanças produzem ansiedade. Sair do emprego, enfrentar pai e mãe opressivos, romper um relacionamento amoroso que me diminui ou amarga. Sair do estabelecido e habitual, mesmo ruim, é sempre perturbador.
O desejo de ser mais livre é forte, o medo de sair da situação conhecida, por pior que ela seja, pode ser maior ainda. Para nos reorganizarmos precisamos nos desmontar, refazer este enigma e descobrir qual é, afinal, o projeto de cada um de nós.
Amadurecer auxilia na tarefa de ver melhor a realidade, e não é uma catástrofe. Ler ajuda. Abrir os olhos para o belo e positivo ajuda. Amar e ser amado ajuda. Terapia ajuda.
O bom humor é uma qualidade atraente e uma atitude sábia. Não se trata de sarcasmo, de divertir-se à custa de alguém, mas de rir de si mesmo na hora certa, respeitar-se e amar-se, mas não se julgar sempre injustiçado e agredido.
É importante não correr para os braços do outro fugindo da chatice da família, da mesmice da solidão, do tédio. É essencial não se lançar no pescoço do outro caindo na armadilha do "enfim nunca mais só!" Porque numa união com expectativas exageradas decreta-se o começo do exílio.
"Se você ama alguém, deixe-o livre".
O espaço entre opressor e oprimido é um vazio.
Laços podem ser reconstruídos, remendados ou cortados. O corte se faz com mais ou menos generosidade, carinho ou hostilidade e raiva sempre com dor. Porém nenhuma união deveria ser a sentença definitiva de aniquilamento mútuo dentro de uma jaula.
A cada transição executamos nossos rituais, perdemos alguns bens e ganhamos outros, alguns duramente conquistados.
A vida não está aí apenas para ser suportada ou vivida, mas elaborada. eventualmente reprogramada. Conscientemente executada.
Não é preciso realizar nada de espetacular.
Mas que o mínimo seja o máximo que a gente conseguiu fazer consigo mesmo.

Texto extraído do livro: Perdas e Ganhos da escritora
Lya Luft


3 comentários:

  1. Muito boa a matéria!
    Olá Cláudia participe da equipe de colunistas do site www.bemcomvoce.com
    Envie seu perfil para colunistas@bemcomvoce.com

    Abraços!

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  2. Olá Cláudia, lindo o texto, foi bom revê-la. Bjs

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  3. Excelente, excepcional...wonderfull....divinamente inspirado....

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