segunda-feira, 25 de outubro de 2010

ABORTO



por Cláudia Piasecki
Você é à favor ou contra o aborto?
Essa é a primeira pergunta que surge quando se toca no assunto.
Durante uma entrevista, dia desses, o candidato a presidência José Serra cometeu um "ato falho", dizendo que era à favor do aborto, rapidamente "corrigiu", dizendo que era contra. Bem, talvez ele não queira perder os eleitores que tem posição contrária ao aborto. Já que, ser contra o aborto no nosso país parece algo como: "ser politicamente correto".
Não sei se a relevância está em ser contra ou à favor, mas sim está em discutir cada vez mais esse assunto que é permeado por tantos tabus e preconceito.
A verdade é que pelo menos um milhão de mulheres fazem aborto no Brasil todos os anos. Muitas dessas mulheres morrem logo após provocarem o aborto, algumas morrem antes mesmo de conseguir atendimento médico.
O que mais me intriga é que o aborto é um tema que tem relação direta com as mulheres e geralmente é discutido por homens, ou melhor "autoridades" masculinas, sejam elas autoridades políticas ou religiosas. Raramente o tema é discutido pelas mulheres. A classe feminina ou o gênero feminino tem pouca influência ou representação nessas instituições, apesar de estarmos prestes a ter a primeira presidente mulher da história do Brasil.
Como mulher e cidadã, acredito que cabe a nós mulheres fazermos esta escolha. Afinal, vivemos num país democrático, ou não? Como fica a liberdade corporal e de expressão? Por que devemos continuar subjugadas por uma lei antiquada? Que, diga-se de passagem, não é cumprida, já que tantas mulheres praticam o aborto! E o que é pior, em clínicas clandestinas (já que o aborto é ilegal), mas que é do conhecimento de todos que elas existem! Inclusive do conhecimento das autoridades!
Como diria Bóris Casoy: "Isso é uma vergonha"...
Vivemos num regime hipócrita! Aceitamos o aborto indiretamente, sendo contra ou à favor...não importa. Todos fecham os olhos para esta realidade, ou você, caro leitor, já viu alguma mulher cumprir pena por praticar o aborto? Ou já viu algum médico ser preso pela prática "ilegal" do aborto?
Volto a dizer: hipocrisia!
A verdade é que nós mulheres estamos desamparadas com leis tão obsoletas e machistas!
Segundo a Pesquisa Nacional de Aborto feita pela Universidade de Brasília (UnB), com o apoio da Agência Ibope Inteligência e do Ministério da Saúde, uma em cada sete brasileiras entre 18 e 39 anos já realizou ao menos um aborto na vida, o equivalente a uma multidão de 5 milhões de mulheres. De acordo com o estudo, na faixa etária entre 35 e 39 anos a proporção é ainda maior: uma em cada cinco mulheres já fez um aborto. A pesquisa revela que ao contrário do que se pensava, a mulher que pratica aborto no Brasil é casada, tem filhos, religião e pertence a todas as classes sociais.
Se o aborto fosse permitido pela lei, certamente as mulheres se sentiriam mais amparadas e seguras, pois caberia a elas fazer a escolha, e as clínicas poderiam atendê-las sem a sombra do preconceito, inclusive com a participação de um profissional psi na equipe, que auxiliasse numa escolha consciente.
Talvez, algumas pessoas digam: "Mas se o aborto for legalizado, vai ficar banalizado, o número de abortos vai aumentar muito".
Não creio. A proibição só contribui para um atendimento precário que leva muitas mulheres a óbito. A ilegalidade não inibe essas mulheres da prática do aborto.
Talvez o governo não tenha interesse em reavaliar a lei e legalizar o aborto para não ter que arcar com a despesa. É preferível a omissão, fazer de conta que não se vê e deixar com que essas mulheres paguem com a vida.
Concluo enfatizando que esse assunto é de interesse feminino, e cabe a mulher fazer esta escolha. Não creio que este direito ou poder deva ser dirigido aos políticos ou aos religiosos.

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Cláudia Maria Piasecki
Psicóloga Clínica
CRP 08/10847
cmpiasecki@bol.com.br

3 comentários:

  1. Olá,

    Eu acho que há informação suficiente à disposição de quem quer saber qualquer assunto hoje em dia. Especialmente sexualidade.
    Além do mais, já existe uma lei que permite o aborto, o que deve-se fazer é cumprir a lei. É sensato permitir o aborto em caso de estupro ou risco de vida para mãe ou feto, ou mal formação do feto.
    Essa lei já existe, que se cumpra! E que traga benefícios reais às mulheres.
    O que se deve analisar é que existem dezenas de maneiras de se evitar a gravidez, algumas de opção exclusiva da mulher outras de opção do casal. É impossível que nenhuma delas possa ser usada em algum momento da vida da mulher ou do casal.
    O que não pode acontecer é se usar aborto como método anticoncepcional. É é isso que no final das contas a liberalização total do aborto leva a pensar.
    Transa hoje com um, engravidou? Aborta. Engravidou de novo, aborta.
    Ora isso é assassinato serial, não é liberdade nenhuma, pra mulher nenhuma.
    Infelizmente conhecí uma moça, há algum tempo atrás, que tinha abortado várias vezes. Ela não tinha relacionamento fixo, não se protegia e não exigia proteção dos parceiros eventuais. Resultado: engravidou de uns cinco caras diferentes só no período em que eu tive contado com ela. Como não eram relacionamento sérios, ao saber que ela engravidava, os caras caiam fora. Atitude dela: aborto clandestino. Anticoncepcional, camisinha, tabelinha, coito interrompido, etc, etc, não passava pela cabeça dela...
    Liberar o aborto sem restrições seria dar aval a pessoas assim.

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  2. Complemento ao meu comentário anterior:

    Depois de ler meu comentário anterior e considerando os pontos que coloquei, gostaria de deixar a seguinte pergunta: Afinal pra quê se deseja a liberalização do aborto?
    Por quê se tem que chegar a esse ponto? É algo mesmo necessário? Os meios existentes de se evitar a gravidez não servem? A lei que existe não serve às situações extremas onde um aborto poderia ser feito? Afinal o que realmente se deseja com isso?

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  3. Excelente seu artigo, Claudia! De fato esta questão diz respeito à FEMINILIDADE e há quem diga q - se os homens engravidassem - o aborto já seria legalizado há mt tempo, pois são eles q "impedem" a legalização pq pretendem perpetuar o controle sobre os corpos femininos, que remete aos primórdios da civilização, quando a reprodução passou a influenciar a herança, direito de propriedade e o corpo da mulher foi subjugado pelo homem. O aborto ilegal é humilhante para nós e ultrajante para as mais pobres, q arcam com as consequências de não contarem com um atendimento médico, assistencial e psicológico adequado, a ex. do q ocorre nos países desenvolvidos. Ofereço minhas reflexões em http://piperacea.blog.terra.com.br

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